Andei aqui para a frente e para trás com este texto e este título. O tema deveria ser a Festa de Tomate Coração de Boi do Douro, que teve mais uma edição gloriosa este Agosto. Poderia ter ido pelas habituais referências testiculares, “Uma Dupla com Tomates” ou coisa do género. E depois arrancava com os vencedores do concurso (Quinta do Pessegueiro, aplausos). E assinalava o terroir e as vicissitudes climáticas que atormentaram o fruto. E publicava, eventualmente, numa revista da especialidade.

Mas é sobre a Celeste e sobre o Edgardo que, na verdade, quero escrever. Independentemente de o coração de boi do Douro ter dado, outra vez, prova da sua crocância e umami — e de a festa ter acontecido na Quinta de Nápoles, uma das mais bonitas da região, com o anfitrião Daniel Niepoort a tomar conta de todos e a servir grandes vinhos. Independentemente da festa do tomate do Douro ter sido um sucesso, estes dois é que são notícia. Porque eles foram e são maiores do que os tomates do Douro.

Oiço falar da Celeste Pereira desde os tempos do Público, onde coincidimos na mítica secção Local. Ela publicava de Trás-os-Montes, eu de Lisboa. A Celeste já não faz jornalismo, mas faz comunicação, através da sua agência Greengrape. E isso assenta-lhe muito bem. No Alto Douro, todos a conhecem há muito, mas o país todo deveria saber do que tem feito, escrito e batalhado, pela promoção do Douro, sempre de forma arguta, sofisticada, conhecedora. E devia pôr-lhe nas mãos mais responsabilidades, mais desafios.

Não é uma duriense episódica, nem sequer faz como esses produtores abastados que não tiram o pé do duplex na Foz e depois choram na imprensa e nos gabinetes da Agricultura as dores dos socalcos e do calor. A Celeste vive com muitos filhos em Arroios, perto de Vila Real, numa casa lindíssima e aberta, numa desarrumação feliz, cheia de quadros e instalações que ela própria cria. E é daí que olha este país obcecado com Lisboa, este país que sobe ao Norte como quem vai encher o bandulho numa excursão exótica, para depois regressar sem dar nada de si.

Ora, não foi isso que fez o Edgardo Pacheco. O Edgardo escreve para o Público, dispensa apresentações. Anda por este país como poucos e em todo o lado dá de si. Foi assim que, com a Celeste e o amigo Abílio Tavares da Silva, produtor do Foz Torto e tomateiro encartado, certa vez foi ao Douro, comeu dos seus frutos e questionou-se: “E um concurso que juntasse os hortelãos das quintas e os seus extraordinários tomates?” Celeste ouviu, Celeste fez acontecer.
Já lá vão cinco edições, se não estou em erro. Foi a segunda vez que fui convidado para o evento. Gostei muito da primeira, mas mais desta, porque participei na prova (como provador não votante).
O grande momento da sessão, aconteceu mais ou menos a meio — e mostra o talento do Edgardo para nos mostrar o valor do conhecimento. O 10º tomate a vir para a mesa apanhou todo o painel de surpresa — , como de costume, liderado por Francisco Pavão, transmontano, grande especialista em azeites. Era um tomate incrivelmente mais desinteressante do que os outros e isso foi consensual (Já agora, também foram consensuais os três primeiros lugares, mesmo sendo uma prova cega e sem converseta entre os jurís).

Na recolha dos pratos, eis quando o Edgardo — que desta vez escolheu ficar a liderar o corte e distribuição dos ditos, sem dar notas —, aproxima-se para anunciar que, aquele tomate, não era um coração de boi, mas sim um ligúria. A forma era mais a de uma pêra do que a de um coração, “com o pedúnculo para fora e não para dentro”. Os ligúria são vendidos em muitos supermercados e mercados como coração de boi, por serem mais resistentes ao transporte. Mas tivemos ali uma prova impressiva das diferenças entre uns e outros.

No dia seguinte, os convidados rumaram da Quinta de Nápoles para a aldeia de Arroios. É lá, com os seus vizinhos e os seus amigos, que Celeste organiza o arraial que encerra a Festa do Tomate. Uma maravilha. Tínhamos vendedoras da terra com banca de cebola e batatas e alhos. E umas bifanas extraordinárias, a sair do porco no espeto. E o Joaquim Fidalgo a liderar a banda (esse mesmo, que comenta na RTP3), como de costume, mesmo em frente à igreja.
Comunicar comida é isto. E Celeste e Edgardo fazem-no como ninguém.
que bom é ler um artigo destes! Obrigado Ricardo, enche-nos a lama de satisfação.
Obrigado, eu, Paulo.
Alma e não lama! 😲😁
Que me perdoe o Edgardo, mas eu só conheço a Celeste. Os elogios são todos merecidos!
Parabéns também ao autor do texto, está ao nível da tomate coração de boi: delicioso!!!!
Depois de ler um artigo fantástico como este, escrito por alguém que não precisa de apresentações, eu como fotógrafo destes eventos ligados ao tomate coração de boi do Douro há alguns anos, sem querer acrescentar nada ao que o Ricardo Felner escreveu, reforço que a Celeste Pereira e o Edgardo Pacheco estão a fazer um trabalho maravilhoso sobre o Douro e em especial sobre este produto, com características de excelência para os grandes apreciadores. Douro não é só vinho…
Concordo e reitero que os olhares de quem “patrocina” devem estar mais focados para estes projetos, que tanto promovem o nosso país.
Vale a pena acompanhar de perto o trabalho incrível da Celeste e do Edgardo, duas pessoas incansáveis que abraçaram este projeto com alma e coração pelo Douro. Parabéns!
Que orgulho tenho na Celeste e no trabalho que tem feito. Minhota que abraçou o Douro,como seu. E ja é. Vai deixar marca.O Douro teve sorte quando o Nuno,marido da Celeste a levou para Vila Real.
Este fantastico trabalho e sucesso apenas e só se consegue com paixão e profissionalismo.
Que me desculpe o Edgard ,que ainda não conheço pessoalmente tera com toda a certeza e da mesma fibra
Foi mesmo uma festa à moda antiga, a Celeste é a melhor anfitriã e o tomate maravilhoso. Não podíamos estar em mãos mais capazes. Belo artigo, Ricardo!
Hoo amigo Edgardo, há que anos que já não te vejo? Um abraço de Vila Franca do Campo.