Uma amiga minha contou-me que tem um namorado que tem um barco. Um barco decente, nove metros de comprimento, atracado em Oeiras. Problema um: ela enjoa. Problema dois: uma pessoa não pode fazer como o jet set no sul de França, que atraca o iate e mergulha no meio do mar.
– Vocês não imaginam. Chegamos ali a Cascais e a água está cheia de alforrecas!
E está mesmo e não é só em Cascais. Um pouco por todo o mundo, as alforrecas têm ganho aos peixes. Há quem diga que resistem melhor às águas ácidas e poluídas e as águas estão cada vez mais ácidas e poluídas; há quem diga que roubam o alimento que devia ir para os robalinhos e para as douradinhas. Em qualquer caso, proliferam e uma das melhores formas de travar a tendência é comê-las.
Em Maio passado, a Food and Agriculture Organization disse isto mesmo e lançou um apelo, logo a seguir à sua campanha insectívora, para que tratássemos de comer alforrecas, muitas. De imediato, por todo o mediterrâneo ouviu-se um bruáá de indignação. Não bastava o incentivo à dieta de larvas e de formigas. O pessoal do bife do lombo mostrou-se ofendido ou gracejante e acusou: a agência das Nações Unidas estava a tornar-se a Isabel Jonet das organizações internacionais.
Como no caso dos insectos, no entanto, o histerismo pareceu-me precipitado – e fui indagar. A luz veio da China. Muito previsivelmente, aquela rapaziada tem uns bons milénios disto; andávamos nós a assar pernas de carneiro na fogueira, entre espadeiradas aos mouros, e já eles cozinhavam alforreca ao vapor.
Abreviando.
Há notícias de que o mestre taoista Peng Zu, da dinastia Yin (1900 – 1066 a.C.), deliciava-se com alforrecas. Diz a lenda que viveu até aos 400 anos, o que parece suportar (e até ultrapassar, vamos lá…) o panegírico nutricional presente na literatura científica alfarroquenha. As medusas têm proteínas boas, muitos antioxidantes, colagéneo com fartura (bom para ossos e tendões) e zero colesterol.
Hoje em dia, a espécie rhopilema esculenta é produzida em grandes áreas de aquacultura na China, mas também na Austrália e na Namíbia – e exportada para todo o mundo. Como se sabe, frequentemente, o sentido de “exportada para todo o mundo” exclui Portugal. Como venho aprendendo, também frequentemente, excluir Portugal não significa excluir o Martim Moniz.
O supermercado Hua Ta Li vende alforreca pré-cozinhada e embalada e é provavelmente aí que o restaurante Yum Cha, em Oeiras, se vai abastecer.
Naturalmente, adquiri já o meu exemplar, mas antes de lhe mexer fui ao Yum Cha. Do menu consta uma clássica combinação tailandesa, em salada fria: malaguetas frescas, coentros frescos, cebolinha, lima e, provavelmente, molho de peixe. A alforreca surgiu transparente, em tiras, sem um sabor bem definido. A consistência era parecida com a dos tendões de vaca, cartilaginosa, divertida de trincar – bom para acompanhar com uma cerveja fresca no Verão.
Em conclusão, a alforreca não mete medo a ninguém, como seria de esperar. Ao pé de do odor fecal de umas tripas enfarinhadas, por exemplo, é como gomas para crianças.
Existe um restaurante em Sessimbra, o Ribamar, que também tem alforreca!
Isso é interessante. E como a fazem, Rita, sabes?
Belo post. Gosto também de partir do princípio de que, se alguém come em alguma parte do mundo, é capaz de ser fixe. Nunca provei alforreca, nem quando vivi na China (pelo menos que eu saiba, porque enfim…) mas fiquei curiosa.
Olá Ana,
Não sei porquê, mas o seu comentário foi parar ao spam. Só hoje me apercebi.
Um abraço
Eu já comi há uns anos na Tailandia. Não é bom nem mau, Estava “afogado” em molho de soja. Tinha uma crocancia estranha